segunda-feira, 24 de junho de 2019


Aliás, o amor da rainha, de quem depressa se tornou amante, dava-lhe coragem para tudo. Ela apoiava-o agora com todo o seu poder, escondendo tão pouco o seu amor que, rapidamente, as línguas começavam a ouvir-se na corte de Copenhaga. O centro destes mexericos, que depressa se transformaram em falatórios, situava-se nos aposentos da rainha-mãe.
   Quase nunca se via Júlia Maria. Vivia retirada nos seus domínios(...) Praticamente senhor do Conselho, Sruensee (...) Quer fazer da monarquia dinamarquesa uma monarquia constitucional e, para isso, liberta os camponeses e tenta melhorar a sua condição de vida, pois não passavam de servos. Reforma a justiça. No dia 14 de Setembro de 1770, suprime a censura de livros (...) reforma o exército comandado por Rantzau e confia as finanças ao seu próprio irmão (...) Em seguida, suprime a tortura, cria asilos para crianças abandonadas (...)
   Alguns meses depois, Carolina Matilde dava à luz uma menina loira de olhos azuis... uma menina que tinha a testa demasiado alta, a boca demasiado bem desenhada para ser filha de Cristiano VII. Mas a jovem rainha não se preocupou (...) Foi a essa mesma hora, a meio da noite ainda negra, que Júlia Maria, seguida por Rantzau, entrou no quarto onde Cristiano VII dormia um sono agitado (...) Era bastante real aquela carta (...) A jovem rainha felicíssima, contente por ter uma filha do homem que amava, proclamava imprudentemente essa felicidade ao longo de uma vintena de linhas apaixonadas.
(...) Uma hora depois, a desgraçada Carolina Matilde era arrancada da sua cama, atirada para uma carruagem gradeada e levada a grande trote para a prisão, enquanto os seus aposentos eram vasculhados de cima abaixo. (...) As provas do adultério da rainha reunidas pelos conjurados eram demasiado evidentes. (...) A soberana deposta fora condenada à prisão perpétua na fortaleza de Kroenberg. Ou seja, a morrer rapidamente de frio e miséria. (...) Júlia Maria podia esfregar as mãos ao evocar as torturas que esperavam aquela que ela odiava. Mas esquecera uma coisa que, porém, não deixava de ter importância: a Inglaterra.
   Alguns dias após o veredicto, uma fragata inglesa, com as escotilhas abertas, os seus oitenta canhões em bateria e o pavilhão real a flutuar na ponta do mastro, entrava no porto de Copenhaga. Esta fragata transportava lorde Keith, ministro da Marinha, que vinha, em nome do rei Jorge III, exigir a libertação imediata de Carolina Matilde, princesa inglesa (...) Nem Júlia Maria nem Rantzau tinham dúvidas. Era preciso ceder sob pena de ver os canhões ingleses disparar sobre a cidade. E fizeram-no, de má vontade..
   Carolina Matilde e a sua filha (...) tomaram lugar a bordo da fragata (...) Com o orgulho britânico salvo, Jorge III não pretendia acolher na sua corte uma esposa culpada e foi para a costa de Hanôver, então possessão inglesa, que a fragata dirigiu o seu rumo (...) só mudara de prisão, ainda que o castelo de Celle fosse infinitamente mais confortável do  que Kroenberg. (...) Três anos depois, na madrugada de 10 de Maio de 1775, faleceu na sequência de uma doença súbita contraída quando ela própria tratava uma das suas criadas.
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 Benzoni, Juliette. Rainhas Trágicas. Lisboa: Edições 70, 2007, pp 287-294.
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