domingo, 14 de julho de 2019
Souvenir
Todo o tempo, vamos embora
e, no entanto, não nos perdemos
de vista em instante algum
Tentamos um novo enredo,
mas a memória é outro corpo
que arrastamos e decai
com os nossos, permanece,
cicatriz, nome que nunca cessa
E se nos víssemos entre os vivos,
outra vez na multidão? A imagem
fixa de susto e nos perguntaríamos:
e agora, quem some? Nenhum
de nós: somos a provação,
o cravo nas costas, as vértebras
e suas cracas para sempre,
um aleijão, a fisgada em cada gesto
Não nos esquecemos, sim,
nos esconderíamos com a mentira,
não nos lembraremos, não
nos lembramos de esquecer,
tornaremos os rostos à parede
mais vendo assim, transe,
mais sabendo que somos nada,
aprisionados nos nossos estômagos
Sim, a memória é uma unha
e ainda que cortemos o dedos
que a leva, e mesmo amputados,
leríamos a mutilação, a dor
fantasma, o concreto, toxina,
o plástico nas narinas,
o afogamento, a despeito
das transparências
E nos olharíamos, os mesmos,
quase os mesmos, despojos
de dias gastos.
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Bresciani, Alberto. Fundamentos de ventilação e apneia. São Paulo: Editora Patuá, 2019, pp 108-109.
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