quarta-feira, 2 de outubro de 2019


   Entretanto, o tempo passa a correr, a sua batida silenciosa marca, cada vez mais apressada, o compasso da vida; não pode parar nem por um instante, nem sequer para olhar para trás. "Pára, pára!", apetece-nos gritar, mas percebemos que é inútil. Tudo se afasta a correr: os homens, as estações, as nuvens; e não serve de nada agarrarmo-nos às pedras, resistir em cima de algum rochedo, os dedos exaustos abrem-se, os braços pendem inertes, é-se de novo arrastado pelo rio, que parece lento, mas nunca se detém.
   De dia para dia, Drogo sentia aumentar esta misteriosa ruína, e em vão tentava contê-la. Na vida uniforme da Fortaleza faltavam-lhe pontos de referência e as horas fugiam-lhe antes de que as pudesse contar.
   Depois havia aquela esperança secreta pela qual Drogo dissipava a melhor parte da vida. Para a alimentar sacrificava levianamente um mês após o outro, e nunca eram suficientes. O Inverno, o longo Inverno da Fortaleza, não foi mais do que uma espécie de adiantamento. Terminado o Inverno, Drogo esperava ainda.
(...)
   Pouco a pouco, a sua fé esmorecia. É difícil acreditar numa coisa quando estamos sós e não podemos falar disso com ninguém. Foi precisamente nessa altura que Drogo se apercebeu de como os homens, por muito que se estimem, permanecem sempre distantes; que se alguém sofre, o sofrimento é totalmente seu, mais ninguém pode tomar para si uma pequena parte; que se alguém sofre, não é por isso que os outros sentem dor alguma, mesmo que o amor seja grande, e é isso que causa a solidão.
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 Buzzati, Dino. O Deserto dos Tártaros. Barcarena: Marcador Editores, 2014, pp 209-210.
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