sexta-feira, 29 de março de 2019
Pela lonjura
a infância é agora anemia.
O cantil da inocência
está vazio de especiarias
e as mães já não vêm
polonizar o medo com açafrão.
Estas, todos os dias,
tocavam Strauss nos nossos cabelos.
Por isso, acreditávamos,
é num pente que se navega
a primeira vez o Danúbio.
Os brinquedos,
território bêbado de lâmpadas,
pomar de cítaras e violinos.
Mais tarde,
a circuncisão.
Afinal,
entre as ameixas da mulher amada
não pousaram apenas as aves da nossa saliva.
Do bosque ao útero
a côncava viagem dos frutos de rapina.
Como Gamoneda, questionamos:
Que hora é esta,
que erva cresce na nossa juventude?
A velhice,
lento definhar do incenso.
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Pereira, Alberto. Como num naufrágio interior morremos. Pontevedra: editora Urutau, 2019, pp 38-39.
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