A
vida não tem nada de glorioso. Nascemos, cumprimos – entre o hábito e o
biológico – uma série de etapas e depois morremos. Convenhamos que, como ideia
de glória, é coisa de parca substância! A vida até pode ter o seu quê de
miraculoso, já que em vez de um nada absoluto viemos aqui ver a luz do dia, o movimento das cidades, o verde dos campos
e, sobretudo, viemos estar com os outros, experienciar essa qualquer coisa que
é amar e ser amado… Sim, de miraculoso pode haver algo na vida, mas de glorioso
não! Num pequeno livro sobre a Relatividade, Russell soube precaver-me, logo na
minha adolescência, contra a miragem da Duração: há animais que duram apenas um
dia, há árvores que duram quatro séculos, há seres humanos que duram cem anos,
há estrelas que duram milhares de milhões de anos, ou seja, a vida não só não
tem nada de glorioso como é ridiculamente breve. Sabemos que um ou outro pode
alcançar um lampejo de brilho, embora eu não entenda para que lhe servirá isso
depois de morto. Sempre soube que o jogo dos espelhos – aquele que nas barracas
das feiras nos engordam e aumentam -não passa disso mesmo: um jogo, um momento
breve sem importância alguma. Assim, a questão que sempre se me colocou, e com
veemência, nunca foi porque estou aqui ou o que será isso do “para lá de”,
aquilo que sempre me inquietou foi: como passar pelos outros provocando-lhes o
menor número de danos possível e protegendo-me igualmente o melhor que souber?
É este imperativo ético que tenho procurado transmitir, com algum sucesso, aos
novos do meu clã. O resto não me interessa minimamente, nunca me interessou,
não creio que me venha a interessar.
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© Victor Oliveira Mateus. Inédito. Facebook, maio, 2019.
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