domingo, 28 de junho de 2020


    Em segredo, pelos erros


Não me grites essas palavras gastas, não desenhes
no rosto nada que se pareça com o entardecer;
se o dia desaparece diante de nós, um anjo atrasado,

entre dois gritos intermináveis, abrirá as veias a rir;
o istmo está no fundo da cave, a ilha está seca,
é o que resta de um velho e sombrio continente,
o ogre corta aos cubos os dias abandonados;

já não sei o caminho, não voltarei à casa onde cometi
os erros, resisto a escrever a tinta da china avermelhada
no crânio que deixaram aqui abandonado, na mesa
em que espero a chegada da lua, o homem da lenha;

das nuvens mais escuras, da arca do trigo, da saída,
por favor, não me grites essas palavras, não me grites,
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  Moutinho, José Viale, Os Cimentos da Noite, Poesia 1975-2018. Porto: Edições Afrontamento, 2020, p 300.
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