domingo, 15 de novembro de 2020


                                                  Donald Winnicott (1896/04/07-1971/01/25)


    A propósito dos cuidados maternos, torna-se essencial evocar a contribuição de Winnicott, que foi um excelente observador das relações precoces mãe-bebé. Para este pedopsiquiatra inglês, existem três funções maternas, indispensáveis para o desenvolvimento harmonioso da criança.

- A presença materna no momento adequado oferece à criança a ilusão de experimentar que é ela que é capaz, na sua omnipotência, de dar existência à sua mãe, que surge no momento oportuno, quando ela tem necessidade. Há, então, esta impressão que ela criou o objeto. Diz-se que ela fez a experiência da omnipotência criadora ou alucinatória que consiste em fazer aparecer a sua mãe quando a criança dela tem necessidade. É aquilo a que Winnicott chama a "presentificação do objeto" (object-presenting).

- A mãe sustenta a criança através dos cuidados maternos e tem um papel de para-excitação. Ela tempera as excitações cuja intensidade demasiado importante ultrapassariam as capacidades da criança de lhe fazer face. Esta função é fundamental no desenvolvimento do eu. A integração do eu está associada ao desenvolvimento sensório-motor e à capacidade de criança em reconhecer aquilo que sente: fome, sede, frio, desconforto. Desta integração deriva a aquisição do "eu". Esta capacidade em controlar-se é designada por holding por Winnicott.

- Os cuidados prodigalizados à criança participam na capacidade desta integrar os seus limites corporais e, por consequência, ter noção da sua interioridade.  (...) a manipulação física do bebé - handling - intervém na personalização.

   Graças ao holding (...) e ao handling (...). A criança adquire o sentimento de habitar o seu corpo. (...) A criança relaxa pouco a pouco o seu lado fusional sem precisar de conhecer angústias insuportáveis devidas à perda brutal do holding e do handing. E, mesmo quando sente sentimentos de cólera pela ausência da mãe, a criança é já capaz de manter nela uma representação da mãe.

  É a isto que Winnicott chama a mãe suficientemente boa, que ele define como aquela que é capaz de aceitar que a sua criança viva as primeiras frustrações que irão estruturar o seu desejo graças à falta que ela vivenciará como motor. Essa mãe não será nem ausente em demasia, mas também não demasiado possessiva ou invasora. Ela aceita que a sua criança se diferencie dela e aceda à emergência do desejo. Uma resposta caótica, desordenada ou imprevisível às necessidades da criança pode ter um valor de ingerência ou de negligência e dará à sua construção do mundo um caráter fragmentado. O que pode, também aí, favorecer a eclosão duma estruturação perversa a título defensivo para evitar uma fragmentação psicótica da criança.

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 Barbier, Dominique. La Fabrique de l'homme pervers. Paris: Odile Jacob, 2017, pp 85-87 (Tradução de Victor Oliveira Mateus).

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