domingo, 4 de novembro de 2018

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                               A Morte do Poeta
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Se quiseres matar o poeta
não lhe abras brigas, questiúnculas,
polémicas na praça pública.
Se o quiseres, de facto, bem morto
sê seu amigo.
Seu muito amigo mesmo!
Escuta-lhe os desejos, as dúvidas,
os voos, por mais insignificantes
que te pareçam.
Se acaso ele necessitar, apresenta-lhe
até um livro em local de prestígio,
depois, em farsa bem encenada,
deixa escapar para os pares
que o livro não prestava,
mas não podias fazer de outro modo
já que és seu muito amigo.
Se quiseres matar o poeta
tece-lhe elogios nas redes sociais,
bem à frente de todos,
enquanto em mensagens in box
o vais apelidando de parco
de inteligência e fraquinho de estilo.
( O termo fraquinho costuma funcionar,
mas se alguém se te opuser poderás sempre
substitui-lo por um léxico mais brando,
mais brando mas igualmente eficaz,
algo como: irregular, de arte dúbia…).
Se quiseres matar o poeta
sê diligente, corrosivo, irónico
junto de críticos, dos editores, produtores
televisivos e o mais que possa surgir.
Por fim, quando o vires desfeito,
coloca-lhe o braço sobre os ombros
e queixa-te das injustiças do mundo,
contudo, e pelo sim pelo não,
certifica-te se da tumba não regressa.
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©  Victor Oliveira Mateus (Inédito).
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