A Morte do Poeta
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Se quiseres matar o poeta
não lhe abras brigas,
questiúnculas,
polémicas na praça
pública.
Se o quiseres, de facto,
bem morto
sê seu amigo.
Seu muito amigo mesmo!
Escuta-lhe os desejos, as
dúvidas,
os voos, por mais
insignificantes
que te pareçam.
Se acaso ele necessitar,
apresenta-lhe
até um livro em local de
prestígio,
depois, em farsa bem
encenada,
deixa escapar para os
pares
que o livro não prestava,
mas não podias fazer de
outro modo
já que és seu muito amigo.
Se quiseres matar o poeta
tece-lhe elogios nas redes
sociais,
bem à frente de todos,
enquanto em mensagens in box
o vais apelidando de parco
de inteligência e
fraquinho de estilo.
( O termo fraquinho costuma funcionar,
mas se alguém se te opuser
poderás sempre
substitui-lo por um léxico
mais brando,
mais brando mas igualmente
eficaz,
algo como: irregular, de
arte dúbia…).
Se quiseres matar o poeta
sê diligente, corrosivo,
irónico
junto de críticos, dos
editores, produtores
televisivos e o mais que possa
surgir.
Por fim, quando o vires
desfeito,
coloca-lhe o braço sobre
os ombros
e queixa-te das injustiças
do mundo,
contudo, e pelo sim pelo
não,
certifica-te se da tumba
não regressa.
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© Victor Oliveira Mateus (Inédito).
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