quarta-feira, 7 de agosto de 2019


    O último dos ladrões de cisnes


Já não tenho sombra, risco, ave, ouvido,
a pressa de chegar, o fim que se mova,
despi os dizeres da ganga das calças
coçadas no cu do tempo, esqueço a voz

e já os lábios modulam o acre assobio,
mastigo o risco, o termómetro metido
debaixo do braço, conhecem-me mesmo
doente, de óculos escuros e silencioso,

não serei o último dos ladrões de cisnes,
despeço-me de cada gesto sentimental
como se fosse meu, aceno com o lenço
e entro numas outras cavernas, sorrio,


 Moutinho, José Viale. Inóspita paisagem. Fafe: Editora Labirinto, 2019, p 51.


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