terça-feira, 9 de maio de 2023


Tudo, mesmo o amor, provém do
embate. Não porque o choque seja
necessário, mas, sem o impacto
causado pelo sopro da respitação,
o ar ficaria retido na sua origem.
Tudo, mesmo o amor, se desloca,

até o som da voz. Vivemos a pensar
nos benefícios de uma fusão ou de
uma igualdade, mas até no âmago da
natureza, nada é absolutamente igual
nem de ninguém, só se dispersa. É
isso, a vida, juntar uma gota a outra

gota de modo lento, ágil, moderando
o golpe com um pouco menos de sal,
um pouco mais de sol - tomando
as rédeas ao impulso que parece ser
tudo, tal como a dança do amor, e
se derrete na morte inexistente.


  Ana Marques Gastão. Oníricas. Porto: Assírio & Alvim, 2023, pp 56-57.
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