quarta-feira, 6 de maio de 2020

Celebrou-se ontem, dia 5 de maio de 2020, o DMLP - Dia Mundial da Língua Portuguesa. As ditas celebrações, devido à Pandemia do Covid-19, ocorreram, por screaming, em várias plataformas. Agradeço ao escritor brasileiro David Oscar Vaz o convite para estar presente na plataforma Flipgrid, em cujo espaço participaram dezenas de figuras dos vários países de expressão oficial portuguesa, das quais refiro apenas: o Embaixador de Portugal na Unesco, António Sampaio da Nóvoa; a poeta e ensaísta brasileira e atualmente Professora na Universidade italiana de Peruggia, Vera Lúcia  Oliveira; os escritores brasileiros Marina Colasanti, Luiz Rufato, David Oscar Vaz; o escritor angolano Lopito Feijó, a escritora portuguesa Gabriela Ruivo Trindade, etc., etc. Segue o meu texto alusivo ao Dia e lido no referido evento:
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Defende uma dada corrente filosófica que a Língua, enquanto solo matricial, condiciona de forma necessária dadas formas de sentir e de pensar. Talvez seja de aceitar a questão do condicionamento, mas apenas se o interpretarmos fora da questão de uma exclusividade e retirando-lhe a pretensão de possuir esquemas mentais não susceptíveis de serem encontrados em outras Línguas e em outros Pensares, como, por exemplo, a problemática da Saudade ou variantes de uma espiritualidade e mística de cariz nacionalista.
A Língua condiciona, de facto, a arquitetónica do Pensar e, consequentemente, do Saber, mas apenas se a este processo for acrescentado um certo dinamismo de convivência com o Diferente, bem como a importação de algo que desse Diferente é pertença. Ou seja: se não houver na contínua construção da Língua um único vetor proveniente:
a) desse Diferente - outras Línguas, códigos informáticos, estratégias de uma informação centralizada em poderes globalizantes, etc.
b) ou também se não existir apenas uma emanação, quase sagrada, que faria de uma Língua um dinamismo único tido por inconspurcado pelo diverso.
A Língua vive, pois, desse dialogismo entre o matricial e o constantemente importado, não devendo, contudo, este último ser imposto ao primeiro pelos mais diversos tipos de poder, mas assumido e sempre conversado com esse primeiro. É nesta Dialética que se tornam possíveis duas ocorrências:
I - a autenticidade da escuta de um dado enraizamento;
II - mas também a aceitação de eventuais processos de autonomização de dadas zonas dessa Língua Primeira.
A Língua é, por conseguinte, um território de tensão entre um enraizamento que, de uma forma ou de outra, acabará sempre por emergir num qualquer sussurro proveniente desse tal solo originário e matricial, mas também contém - mesmo que colocada como hipótese! - a autonomização futura de parte desse Si-próprio que se tornará num qualquer Diferente outro. E é isto que nos ensinam diferentes disciplinas como a Antropologia Cultural, a História da Cultura, etc.; e é isto também que se vai observando nas diversas variantes do português, como por exemplo a de Portugal e a do Brasil, onde vamos sempre constatando semelhanças e diferenças, e é por a Língua portuguesa ser esse território onde se joga o Mesmo e o Diferente, é por isso que ela é tão rica.
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                            Victor Oliveira Mateus (Lisboa, 4 de maio de 2020)
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